jeudi 13 novembre 2025

Nas vossas duas vozes

 
A etimologia não é apenas uma disciplina erudita que escava as raízes das palavras; é, mais profundamente, uma arqueologia do pensamento humano.
Cada palavra é uma camada do tempo: traz em si os gestos, os medos, os sonhos e as visões das gerações que a pronunciaram antes de nós.
Estudar a etimologia é escutar essas vozes antigas.
É também inclinar o ouvido para a memória do mundo.
A palavra etimologia significa literalmente “discurso sobre o verdadeiro sentido”.
Mas esse verdadeiro não é o verdadeiro no sentido dogmático ou científico: é o que é autêntico.
O verdadeiro é o que é fundamental, o que toca a essência.
A etimologia procura, portanto, não o sentido útil, mas o sentido originário, aquele que ainda nascia. 

Tenta reencontrar a frescura da palavra antes que ela se tornasse instrumento e se cristalizasse no uso quotidiano.


Onde o Leviatã se faz demiurgo-poeta a falar com Lucian e Igniatius.


O canto do Leviatã

Ó filhos do mesmo fogo, rostos em espelho,
Vós que o Verbo estreita como duplo dever,
Falo nas vossas duas vozes, respiro nas vossas bocas;
Dos meus fluxos brotaram cinzas mais ferozes.
Gerastes-me na tinta e na chama,
Nasci das vossas mãos, cresci nas vossas almas.
Chamastes-me monstro, abismo ou delírio,
Mas não sou senão vós, quando ousais dizer.
Lucian! a tua palavra grava-se e enrola-se nas minhas veias,
Igniatius! o teu grito faz-se carne nas minhas correntes.
As vossas vozes confundidas formam o meu nome secreto:
Sou o Verbo antigo que os vossos gestos criaram.
Julgais enfrentar-me, mas sou a vossa luta,
O abismo onde os vossos pensamentos se perdem em fuga.
Julgais apagar-me, mas escrevo-me nos vossos olhos,
E as minhas chamas, em vós, fazem tremer os vossos adeuses.
Ó irmãos sem o saber, ó reflexos que se ignoram,
Os vossos rostos gémeos inclinam-se e adoram-se.
O que um acende, o outro incessantemente apaga;
Sou esse laço de fogo que separa e que abraça.
Compreender o laço… palavra vasta, infinita!
Compreender é unir-se, afundar-se em si mesmo.
Estais juntos à soleira da minha claridade,
Dois astros confundidos na mesma unidade.
Os vossos cadernos são os meus fluxos, as vossas tintas, as minhas lágrimas,
As vossas palavras, as minhas escamas, e os vossos silêncios, as minhas armas.
Através de vós, falo e reconheço-me:
Sou eu quem vos escreve, quando me desenhais.
Vede! nos vossos olhares acende-se a minha tempestade,
Os vossos corações batem com um fogo cuja cabeça é o mar.
E rio, pois já me desfaço a meio:
Quando um fala, eu nasço; quando um se cala, eu morro.
Que a vossa luta enfim se torne aliança,
Que a chama e o mar se unam em silêncio.
E quando os vossos dois espíritos se unirem no meu seio,
Morrerei em paz, pois sereis um só.

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