“O simulacro não é o que esconde a verdade; é a verdade que esconde que não existe.
O simulacro é verdadeiro.”
O simulacro é verdadeiro.”
Eclesiastes

Atingido pela revelação daquele que julgava ser seu amigo — humilhado, abatido, como um poeta tocado pela língua de fogo — Ignatius ergue-se e começa a declamar:
O homem, no seu saber límpido, foge da lei natural,
Nu sob o céu, sem freio, sem fronteira, sem tutela;
Espírito esquivo, devorado pelo seu próprio esforço,
Quer surgir à luz, mas recua ainda.
Pois o seu ser permanece suspenso, trémulo e só,
Entre a sombra e a chama onde respira a terra.
O capitel desperta, a sombra cintila viva;
Pilares, como ossos erguidos no gelo,
Sustentam o edifício, a sua massa opalina
Oculta a meio o coração cuja alma ruína.
Diviso, a tremer sob este véu de temor,
Fragmentos de um vivo que o passado desdobra:
Fios de memória tecidos em malha estreita,
Onde o vento faz tremer o esquecimento projectado.
Cordas estão ali — tensas, brancas, palpitantes —
Vibrando a cada golpe do sopro e do tempo.
Sustêm o mundo no seu abraço frágil.
Se cederem: tudo tomba — luz e peso desabam juntos.
Lucian, impressionado, toma notas e desenha em silêncio… esse passado tão amplamente ultrapassado…
– É impressionante ver até onde o ser humano pode ir além de si. Conseguirá Ignatius um dia ligar a língua à mão… e firmar-se de novo sem as oscilações do espírito atormentado? Pois bem, sejamos humildes…
Ainda se agarra, vê-se bem… quer manter-se, durar, enraizar-se…
Resta-lhe aprender a passar.
Ignatius acalmou. Fica ali, os olhos quase fechados. Quem poderia imaginar o que, na sua cabeça, apenas passa… sem jamais ser lembrado… mas que nos seus desenhos surge de súbito…
– Veja, Ignatius, o mundo também passa.
Mas há passagens que criam sentido. Cada vez que alguém fala, olha, lembra, ama… ou desenha, cria uma passagem. Liga o que, sem ele, ficaria separado.
E é isso, creio eu, ser vivo. Um ponte talvez, entre duas margens que nunca se tocam por completo…
Essas duas margens podem ser você — o que está aqui… e o que desenha…
Um traz ao outro o que sabe e o que o outro ignora… até que o processo se inverta…
Acontece que conheço o autor dos desenhos que comprou e trouxe para este consultório… e a assinatura ilegível que os marca… não é senão a sua…
pois ninguém além de si próprio pode melhor ilustrar aquilo que, na sombra, permanece você.
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